quarta-feira, 25 de maio de 2016

El País x Liberdades de Expressão e Imprensa

Por Nicholas Merlone

Publicado originalmente no Jornal Estado de Direito (link)

A atual Constituição espanhola de 1978, com relação às liberdades de expressão e imprensa, dispõe:
“Artigo 10 - 2. Las normas relativas a los derechos fundamentales y a las libertades que la Constitución reconoce se interpretarán de conformidad con la Declaración Universal de Derechos Humanos y los tratados y acuerdos internacionales sobre las mismas materias ratificados por España. [...] Artigo 20 - Se reconocen y protegen los derechos: a) A expresar y difundir libremente los pensamientos, ideas y opiniones mediante la palabra, el escrito o cualquier otro medio de reproducción. [...] d) A comunicar o recibir libremente información veraz por cualquier medio de difusión. La ley regulará [...] secreto profesional en el ejercicio de estas libertades. [...] Artigo 20 - El ejercicio de estos derechos no puede restringirse mediante ningún tipo de censura previa.”. (La Constitución española de 1978. Disponível em:  < http://www.congreso.es/consti/constitucion/indice/titulos/articulos.jsp?ini=10&fin=55&tipo=2 >. Acesso em: fev. 2016.)
Desse modo, o diploma constitucional espanhol, primeiramente, garante que os direitos fundamentais e as liberdades que a Constituição reconhece se interpretarão em conformidade com a Declaração Universal de Direitos Humanos e os tratados e acordos internacionais sobre as mesmas matérias ratificadas pela Espanha. Além disso, reconhece e protege os direitos: i) de se expressar e difundir livremente os pensamentos, ideias e opiniões mediante a palavra, a forma escrita ou qualquer outro meio de reprodução; ii) a se expressar ou receber livremente informação verídica por qualquer meio de difusão. A lei regulará o segredo profissional no exercício dessas liberdades. Finalmente, o exercício desses direitos não pode se sujeitar a nenhum tipo de censura prévia. (trad. livre).
Segundo Pinto Ferreira, “O direito de manifestação do pensamento. A liberdade humana não se concretizaria na prática se não fosse dado ao homem o direito de liberdade de expressão.”.
Sendo assim, os indivíduos, enquanto cidadãos, titulares de direitos e deveres políticos, possuem o desejo de livre se expressar, exteriorizando seus pensamentos. Para tanto, contam com a proteção jurídica, de modo que o Estado ou grupos econômicos não o impeçam.
O direito à liberdade de pensamento, em sua trajetória histórica, aparece como meio de defesa contra o Estado arbitrário e a censura. De início, encontra-se previsto de modo mais relevante no Bill of Rights (1689). Porém, foi com a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (1789) que esse direito tomou maiores proporções, passando a ser incorporado às Constituições modernas.
Todavia, o periódico espanhol, El País, segundo o que se nota em trecho de reportagem de veículo midiático português, vem sofrendo interferência do capital de grandes empresas na sua pauta, impedindo investigações sobre corrupção.
“O título dizia tudo: “A comunicação social espanhola está encurralada entre o governo e as dívidas”. A reportagem, que saiu no The New York Times na semana passada, lembrava a imposição da polémica Lei Mordaça em Espanha, citava um relatório que apelava ao aumento da liberdade de imprensa e, sobretudo, destacava as “pressões menos óbvias” aos meios de comunicação. Em suma, dava conta de um panorama mediático espanhol cada vez mais condicionado pela situação econômica dos grandes grupos e pelas pressões do governo de Rajoy para que diversos escândalos de corrupção não sejam investigados.” (Observador.pt)
No contexto, Virgílio Afonso da Silva lembra: “A constituição brasileira, em seu art. 5º., IV, garante a liberdade de expressão nos seguintes termos: ‘é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.’. [...] ‘no capítulo sobre a comunicação social, a constituição, em seu art. 220, garante a liberdade de imprensa, da seguinte forma:’ ‘A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta constituição.’”.
O autor, assim, reflete: “um modelo que se baseia na redução a priori do âmbito de proteção de direitos fundamentais – um conceito que aparentava ser exclusivamente teórico-analítico – tende a significar também uma garantia menos eficaz desses direitos nas atividades legislativa e jurisdicional, por excluir da exigência de fundamentação uma série de atos que inegavelmente restringem direitos.”.
Com efeito, a liberdade de imprensa deve ser assegurada às rádios, à televisão, à Internet, e, igualmente, aos jornais. O capital de grandes grupos econômicos e do governo podem patrocinar os veículos midiáticos, porém se deve evitar a interferência do patrocínio causando censura à pauta das redações, caso contrário se estaria ocorrendo uma verdadeira ditadura com relação às liberdades de expressão e de imprensa.
Contudo, em sentido oposto, o El País Brasil anunciou, contrariando o que até agora se expôs, em 27 de janeiro: “Escândalo da Petrobras faz Brasil piorar em ranking mundial de corrupção”.
No panorama, verificamos que as liberdades de expressão e de imprensa se encontram resguardadas juridicamente e o jornal espanhol, apesar de não se manifestar contra casos de corrupção em seu país, denuncia desvios da empresa estatal brasileira.
Portanto, partindo das lições de Virgílio Afonso da Silva, podemos concluir que essas liberdades (expressão e imprensa) não devem sofrer redução da esfera de tutela nos casos concretos, enquanto direitos fundamentais, já que, caso assim fosse, teriam menos eficácia nos campos legislativo e jurisdicional, se fosse necessário recorrer a essas dimensões, para assegurar esses direitos.
Finalmente, cumpre apenas recordarmos de Konrad Hesse e a força normativa da Constituição. Diferentemente de Ferdinand Lassalle, que afirmava que, caso a Constituição não fosse cumprida, não passaria de uma mera folha de papel, condicionada na verdade pelos fatores reais de poder, Hesse lecionava que a Constituição deveria ser aplicada na prática, fazendo valer o seu conteúdo, mesmo com a interferência do poder (econômico, político etc.).
Espanha e Brasil possuem fortes arcabouços jurídicos (diplomas máximos) protetivos das liberdades de expressão e imprensa. No cenário, cabe à primeira fazer valer o seu texto constitucional tendo como modelo a concretude fática do segundo.

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